terça-feira, 15 de abril de 2014

O Grande Mestre (Yip Man)

Biografia mitológica do mentor de Bruce Lee


2008 / China / 106 mim
China, 1935. A cidade de Foshan prospera em harmonia com suas muitas escolas de artes marciais. O sossego é interrompido com a chegada do forasteiro Jin Shan Zhao que vê a oportunidade de abrir um dojo em meio a tantos praticantes. Para atrair alunos ele desafia todos os mestres da área e derrota-os com facilidade, trazendo vergonha à cidade. Toma conhecimento então de Yip Man (ou "Ip Man"), mestre supremo que não possuí discípulos porém carrega grandiosa reputação. Zhao o encontra e exige uma luta. Muito embora relutante com a proposta, Ip Man vence-o com seu poderoso estilo Wing Chun, defendendo mais uma vez a honra do local.

Todavia, destino muito pior afeta todos em Foshan quando os japoneses ocupam a cidade em 1937, na Segunda Guerra. Ip Man perde a casa e mal conseguindo alimentar a esposa e filho, submete-se a um trabalho precário, enquanto seu país é estilhaçado por ódio racial e conflitos nacionalistas.

General Miura, líder da ocupação em Foshan e habilidoso carateca, convida lutadores chineses para enfrentar seus soldados japoneses, prometendo um saco de arroz a cada vitória. Muitos chineses veem isso como oportunidade de vingança contra a forte opressão, enquanto outros aceitam o duelo pela oferta.
Quando um de seus amigos é levado para a arena e não retorna, Ip Man voluntaria-se e acaba encontrando ainda mais motivos para lutar. Usa então seu Kung Fu para atacar de verdade e surpreende o general ao derrotar vários inimigos sozinho. Mas a vitória representa somente o início da batalha.


Donnie Yen, a celebridade que interpreta Ip Man - que além de ator é diretor, produtor, coreografo e medalhista mundial de Wushu*, disse em entrevistas que O Grande Mestre não trata-se de um filme de Ação, mas sim de Artes Marciais. À vista disso, não se engane; não é só mais um filme chines da antiga "Sessão Kickboxer" da Band com lutas sem gravidade e com enredos sem pé nem cabeça. É competente ao gênero mas ao mesmo tempo consegue inovar, com melhores atuações (talvez o auge de Yen), fotografia mais cuidadosa e som (quase) de qualidade.


Sammo Hung, lutador veterano e aclamado coreógrafo de Hong Kong (mais conhecido no ocidente por trabalhos com Jackie Chan e John Woo), assina o espetáculo visual, com lutas pra lá de eletrizantes. Os movimentos absurdos foram substituídos por golpes mais convincentes, em uma belíssima coreografia que conserva e respeita a doutrina marcial tradicional. 

A pancadaria é em larga escala, mas não abandona o moralismo. A disciplina utópica e o heroísmo são sobrepostos à realidade, o foco é direcionado à filosofia e à coreografia e, para variar, ao velho rancor hongkonguiano dos nipônicos. Tudo isso deixa muito pouco espaço para a incorporação dos fatos históricos.

Em O Grande Mestre não somente os golpes são de mentira, mas igualmente quase toda a narrativa. A obra é levemente baseada na real história do mestre chinês. Quando atrair audiência é objetivo principal, mutações sensacionalistas acontecem e terceiros pontos de vista surgem, afinal o real quase nunca é tão interessante.  

Alguns pontos fracos podem ser notados, contudo não comprometem a aventura. Tampouco as similaridades entre Operação Dragão e O Mestre das Armas defasam seu valor, pois sintetiza o que há de melhor em cada um deles. Assim, assume com louvor um destacado lugar no gênero cinematográfico chines. Recebeu 12 nominações no Hong Kong Film Awards e ganhou nas categorias de Melhor Filme e Melhor Coreografia.

A Verdadeira História



Ip Man (1893 - 1972)
Ip Man nasceu em Foshan em boas condições e cresceu com fina educação. Começou a praticar o Wing Chun aos 13 e aos 24 tornou-se policial. Mudou-se para a vila de Kwok Fu durante a ocupação japonesa retornando somente após a guerra para reassumir o cargo. No final de 1949 o partido comunista ganhou a guerra civil, fazendo-o fugir para Hong Kong sem sua família. Ali abriu uma escola de Wing Chun. Seus estudantes, com o tempo, ajudaram a aumentar sua reputação, superando outros estilos marciais com suas habilidades.

Fumava muito e usava ópio regularmente. Morreu de um câncer na garganta aos 72 anos, sendo um dos primeiros mestres a ensinar o sistema de luta publicamente. Em 1954 teve como discípulo um garoto de 13 anos que o procurou machucado de uma briga de rua. Seu nome era Bruce Lee. Ip Man teve que dar aulas particulares ao pupilo que não era aceito pelos outros alunos por sua mistura étnica. Em 1959 Lee retornou aos Estados Unidos e nunca deixou de praticar o que aprendeu.

O Wing Chun


"Perdurável Primavera" em tradução literal, é uma arte marcial do sul da China que distingue-se por sua simplicidade e eficiência. Desenvolvida para permitir que qualquer pessoa possa defender-se independentemente de idade, força ou sexo; é um combate prático de curta distância que economiza movimentos, composto por defesas, socos curtos e chutes baixos. Descarta acrobacias e anula o alcance dos golpes de oponentes com vantagem física, utilizando o agressor contra ele mesmo ao atacar de dentro de seu perímetro ofensivo.

Sua origem é um mistério. A lenda mais popular é a contada pelo próprio Ip Man. De acordo com ele, Ng Mui foi uma abadessa no monastério Shaolin de Henan que conseguiu escacar da destruição trazida pela forças de Qing durante o reino do imperador Kangxi (1662 - 1722). Em seu exilo, conheceu uma jovem de 15 anos chamada Yim Wing-Chun, que estava sendo ameaçada e forçada a casar-se com um bandido. Ng Mui ensinou Yim como defender-se, aplicando seu grande conhecimento de artes marciais em um sistema que a garota pudesse aprender rapidamente e sem necessidade de uso de muita força. A garota derrotou o agressor e casou-se posteriormente com o guerreiro Leung Bok Chau.
Certo dia, enquanto observava o marido treinar, passou a criticá-lo e a apontar falhas em seu estilo, deixando-o enfurecido. Este, por sua vez, desafiou-a mas foi imediatamente derrotado. Reconhecendo a vitória da esposa, pediu-lhe que o ensinasse e, posteriormente, nomeou o estilo em homenagem a ela.

A grande popularidade do Wing Chun no ocidente veio a partir de seu praticante mais famoso, Bruce Lee. O discípulo de Ip Man praticou, valorizou e difundiu as técnicas, das quais são a base do Jeet Kune Do, sistema de artes marcias que ele viria a criar tempos depois. Bruce Lee morreu poucos meses após seu mestre, em 1973.


Curiosidades


* Wushu significa "arte marcial" ou "arte militar". Tornou-se um esporte derivado do Kung Fu em 1949, num esforço para padronizar a prática das lutas tradicionais. Hoje é um esporte internacional de contato e exibição, com campeonato mundiais a cada dois anos desde 1991.

Em 2010 saiu a continuação Ip Man 2, narrando os eventos da mudança do mestre para Hong Kong até conhecer Lee. Em janeiro de 2014 foi anunciada a terceira parte para 2015.

O personagem já apareceu em diversos outros filmes do gênero. Em 2013 o diretor Kar Wai Wong lançou também uma semi-biografia de Ip Man chamada de The Grandmaster. O conceituado (e rico) diretor dedicou-se por dez anos ao projeto. A tradução brasileira ignorou a existência do antecessor de 2008 e nomeou-o com exatamente o mesmo nome. O outro "O Grande Mestre" e foi exibido nos cinemas brasileiros em Abril de 2014.

Warrior's Dream é um curta de animação muito bacana que concede um encontro às lendas Bruce Lee e Donnie Yen.

Site oficial / IMDB / Trailer

terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Vicious


Reino Unido / 6 Episódios / 2013
Se você está acostumado com a intrepidez de Gandalf ou com a impetuosidade de Magneto, é melhor que esteja preparado para ver Ian McKellen sendo uma amarga bicha louca.

Vicious é uma sitcom britânica produzida por Gary Janetti (Will & Grace e Uma Família da Pesada) sobre o cotidiano politicamente incorreto e vil de um casal gay da terceira idade.

Freddie (McKellen) e Stuart (Jacobi) vivem juntos há quase 50 anos, numa relação sustentada por pesadíssimas afrontas.

A rotina é afetada quando o jovem Ash (Iwan Rheon) se muda para o prédio e passa a visitar para pedir conselhos. Além dele, o casal conta sempre com os desabafos de Violet (Frances de la Tour), uma senhora ninfomaníaca e muito carente.

Um elenco veterano de filmes e de séries televisivas, juntos em um "quase" fiasco, salvo mesmo somente pela reputação de cada um.

A crítica foi severa. Veículos importantes como o  Sunday Mirror, o Guardian, e o Daily Telegraph não se acanharam ao descer a lenha na série. Já o London Evening Standard a descreveu como "uma maldosa paródia que não poderia ter sido mais desagradável mesmo que escrita por um heterossexual malévolo e recriminador".


E mesmo prestigiando o elenco, fica difícil discordar. Situações monótonas, piadas simplórias e humor negro abusado, a ponto de ser desagradável (principalmente quando faz piadas com estupro). Não dá para rir com Balthazar, por exemplo, o supérfluo cão do casal. Contudo, chega uma hora que as ofensas são tamanhas que temos o luxo de algumas gargalhadas.


Em suma, espera-se mais de uma sitcom genuína (gravada com platéia e tudo mais) e, principalmente dos diálogos. A segunda temporada foi confirmada para 2014 (também com seis episódios) e em meio a tanta crítica, é bem possível que a qualidade melhore. Desta temporada, não há muito além de uma auto-paródia dos protagonistas, que apenas vez ou outra são realmente engraçados.


A série foi exibida pelo canal britânico ITV e ainda é inédita no Brasil. Além dos seis episódios, há um especial de Natal.

McKellen, aos 74 anos de idade, exprime avidez pela atuação e, em paralelo, assume uma postura admirável pela sua causa pessoal, a homossexualidade. É um militante presente em diversas frentes pelo mundo todo.

Curiosidades

"Vicious Old Queens" era o título original que acabou sendo amenizado pela emissora.


McKellen disse em entrevista que ele e Jacobi fizeram escola de teatro juntos e tinham uma queda um pelo outro, embora nunca admitiram na época.


Freddie menciona seu papel de vilão em Doctor Who. O ator narra a voz da "Grande Inteligência" no especial de natal de 2012, intitulado The Snowmen.

Antes da série, McKellen já havia nos dado uma engraçada prévia na BBC Two's Extras.

domingo, 29 de setembro de 2013

Todd and the Book of Pure Evil


Canadá/ 26 Episódios / 2010-2012
O site TorrentFreak anualmente faz um levantamento de downloads ilegais e, em 2012, sitcoms como How I Met Your Mother e The Big Bang Theory, por exemplo, tiveram cada uma aproximadamente 2,8 milhöes de downloads por episódio. Com essa ascendente demanda, vertem novas séries e temporadas, em um contexto onde a qualidade está longe de ser prioridade.


Assim como os filmes, os seriados (principalmente os americanos) saturam nossa mente cada vez mais. Sempre a mesma fórmula sócio-psicológica com apelativas doses de humor negro e questões existenciais com contos morais de plano de fundo.

Entretanto, em meio à (µ)torrenciais opções (e decepções) é possível encontrar preciosidades. Penso que não há sensação melhor do que descobrir uma boa obra que consegue, com naturalidade, diferenciar-se da estereotipagem. Todd and the Book of Pure Evil é um digno exemplo disso.

Em 2003, os canadenses Craig David Wallace e Max Reid criaram um curta-metragem sobre um livro satânico que realiza desejos numa escola de ensino médio. Anos depois, a ideia transformou-se em uma série de TV, herdando o mesmo nome.

O protagonista que dá nome ao seriado é um colegial metaleiro que tem como único amigo, Curtis, um gordinho maneta do antebraço esquerdo. Juntos eles formam a maior dupla de perdedores do colégio.

Para se ter ideia, uma garota estéril reclama num episódio: "Eu tentei muito! Transei com todo mundo da escola exceto aquele maconheiro e seu amigo maneta".

Todd é ambicioso, todavia; mesmo sendo péssimo na guitarra, almeja um dia ser uma estrela do Heavy Metal e ainda conquistar o coração de sua platônica Jenny, uma das garotas mais descoladas da escola.

Na tentativa de impressioná-la, Todd encontra um misterioso livro com o desenho de um pentagrama flamejante. É o satânico livro do "Puro Mal"; feito à partir do prepúcio de Judas, somente aparece às pessoas mais desesperadas, oferendo soluções às suas angústias. Acontece que o livro cobra um preço muito alto de todos que o utilizam.

A maldade contida em suas páginas quase destrói a escola, a custo de seu desejo. Jenny, por estar envolvida na bizarrice, reconhece o livro da foto que tem de seu desaparecido pai. Todd vê então a oportunidade de aproximar-se da garota prometendo ajudá-la a encontrar o livro que "fugiu"pelos corredores da escola.

Hannah, uma nerd que curiosamente tem sentimentos por Todd, entra também para a gangue, oferecendo sua inteligência científica na busca. Mas considerando as tantas frustrações que adolescentes enfrentam no colégio, oportunidades não lhes faltam; relacionamentos, obesidade, homossexualidaderendimento escolar e opressão são alguns exemplos de situações que farão muitos afortunados encontrarem o livro.

O diretor da escola, Atticus (gênio!) também carrega um misterioso interesse pelo livro e vê mais chances apossar-lo usando a gangue de Todd a seu favor. Se há bondade em Atticus, ela foi há muito expulsa pelo seu cruel pai, o líder da seita satânica composta por um grupo de velhinhos, sediada num asilo. O velho demanda que o filho encontre o livro a qualquer custo e não se importa com seus sentimentos nem com seus traumas sexuais de sua infância.


Além da gangue, Todd tem apoio do sábio faxineiro Jimmy (Jason Mewes dos filmes de Kevin Smith), que sempre compartilha conselhos e baseados. Há também o trio misterioso de maconheiros, que ficam sempre em frente à escola observando os acontecimentos. São ele que contam sobre a profecia do Puro Mal, a pessoa que conseguirá controlar o livro e será responsável pela total destruição do mundo. O problema é que tudo indica que Todd é o tal escolhido, enquanto sua única preocupação é arrumar meios para ficar com a Jenny.

O humor canadense dificilmente decepciona e Todd é mais um patrimônio digno. Cuidado, entretanto! O enredo maluco e a pobre produção demandam um tempo de adaptação.

Sexo, drogas, metal pesado e muita violência trash: Todd and the Book of Pure Evil é pura fonte de diversão! Uma ótima opção para quem quer sair do "arroz e feijão" dos sitcons contemporâneos.

Todd é composto por duas temporadas com treze episódios cada, mais o especial zero (S02E00 - como todo episódio "00", trata-se de uma amostra, um preview do que está por vir, com entrevistas e cenas dos próximos acontecimentos). P.S.: S02E10 é uma surpresa inesquecívell!

CURIOSIDADES

O curta-metragem que inspirou o seriado, pode ser visto aqui.

Muito infelizmente o canal Spaced não renovou o contrato para a terceira temporada. Houve grandes manifestações de fãs e os produtores, assim como os atores, fizeram muitas campanhas para entregar o desfecho de Todd. A série foi vendida a vários países (Alemanha, Dinamarca, Suécia, Noruega) mas não conseguiu ser renovada. Com doações de fãs já arrecadadas, está sendo produzido para 2014 uma animação Indie chamada The End of the End. O filme terá as vozes de todos os atores da serie. Visite o site oficial para atualizações.










FRASE

♫ Being horny makes me horny ♪

quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Os Croods

Platão salva a DreamWorks


2013 / EUA / 98 mim
DreamWorks Animation já passava por maus bocados, mas foi o fracasso de A Origem dos Guardiões de 2012 que realmente agravou a situação. Em fevereiro de 2013, 350 funcionários foram demitidos e já se rumorava que se Os Croods fracassasse, a empresa rumaria à falência. Acontece que o filme emplacou e rendeu um dos maiores retornos financeiros da história do estúdio.

"Passamos a maioria dos dias dentro da nossa caverna, no escuro. Noite após noite, dia após dia." reclama Eep (Emma Stone), uma garota pré-histórica. Segundo o seu pai Grug (Nicolas Cage), "tudo o que é novo é mal", por isso exige que todos permaneçam sempre na caverna, saindo apenas para buscar alimento. Como a curiosidade de Eep é mais forte que a opinião de seu pai, em uma de suas saídas furtivas conhece Guy (Ryan Reynolds), um garoto muito diferente que fala sobre o "início do fim do mundo". Ela não lhe dá ouvidos até que um terremoto engole sua caverna, e toda a família é obrigada a conhecer um mundo incrivelmente novo, cheio de perigos, maravilhas e incertezas.

Uma animação sem inovação somente para diversão. Não espere nada além disso em Os Croods. Imita A Pequena Sereia, plagia Avatar, rouba vilões de A Batalha de Riddick deseja ser A Era do Gelo. E para temperar essa mistura, um estúpido mascote, um arco iris de cores em cada cena e infames piadas de sogra (por mil diabos! quem gosta de piadas de sogra?).

É parte da identidade das animações atenderem dois públicos, as crianças e os adultos. O segundo público, mais crítico, além de qualificar o filme para outro público, também busca satisfação e tem altas expectativas. Os Croods tenta fazer isso, mas falha, deixando a animação mais para a criançada mesmo.

A falta de criatividade infelizmente atinge toda a obra. Os nomes dos personagens são um desastre; "Eep", em inglês, significa aquele característico gritinho feminino de pânico, enquanto o nome "Grug" é só para rimar com "hug", (abraço); "Belt" (cinto), o estúpido preguiça tem o nome da sua função. Para piorar ainda temos "Guy", "Ugga" e "Gran"... é quando percebemos que até o título é ruim: "Croods", assim como todos os nomes, é outra gíria, dirigida a quem come demasiado e está sempre famintoMais criatividade, penso eu, sairia de uma mente primitiva.

A primeira caçada é um dos pontos fortes do filme (senão o melhor! mesmo lembrando muito a corrida de Tatooine de Star Wars Episódio I: A Ameaça Fantasma). As cenas são muito rápidas e divertidas; os ângulos de câmera e a absurdez dos eventos tiram gargalhadas, principalmente com Sandy, a caçulinha que mais parece mais um animal. O filme todo, na verdade, tem um ritmo muito acelerado; mesmo sem o relógio, os personagens correm contra o tempo para sobreviver e continuar sobrevivendo (assim como o estúdio). Esses rápidos frames dessa aventura pré-histórica talvez não sirvam somente para agravar o humor, mas também para para atender o público moderno e dinâmico, que carece de tempo até para pensar.

O filme apresenta conceitos de Filosofia, com a alegoria da caverna de Platão, Mitologia, com o fogo de Prometeu e Ciência, com a evolução darwiniana. Mas nada digno de reflexões, pois não é o foco. A formula simplista faz sucesso e a DreamWorks é a prova disso. Fazer um filme sem conteúdo, sem muita qualidade gráfica, mas que seja rápido e divertido, é mais fácil e vende muito mais (se colocar um mascote então, nem se fale! Já vimos por aí pinguins, gato de botas, esquilo, Mínions e todo tipo de loucura virarando até franquias - espero que não venha a ser o caso do estúpido Belt).

Por fim, agora que a empresa progride novamente, esperemos que as animações sejam levadas mais a sério, com inovações e surpresas, pois para os dias de hoje, Os Croods não passa de uma animação primitiva.

Curiosidades

Os Croods foi a primeira animação da DreamWorks a ser distribuida pela 20th Century Fox.

Espere os créditos para ver um show dos roedores pré-históricos.

A continuação já foi anunciada (claro!) porém ainda sem data divulgada.

Frase
Never not be afraid.

NOTA 6,5

IMDB: http://www.imdb.com/title/tt0481499/

sábado, 5 de janeiro de 2013

Ted

2012 / EUA / 106 mim

Seth MacFarlane (criador de Uma Família da Pesada) leva seu humor inteligente às telonas, em seu primeiro filme com atores reais. O resultado é uma obra fiel à sua criativa e ousada abordagem critica e maldizente.

John (Mark Wahlberg) é uma criança solitária que é constantemente rejeitada pelos outros meninos de sua idade (fato explicado em uma das cenas mais engraçada do filme). Triste na noite de Natal faz seu inocente e sincero pedido, que seu novo presente, um ursinho de pelúcia, pudesse falar, tornando-se assim seu melhor amigo.

Como "nada é mais poderoso do que o pedido de um garotinho", na manhã seguinte, o desejo torna-se realidade. Diferente do tigre Haroldo de Calvin, Ted realmente ganha vida e interage com todos. "Um milagre de Natal... Como o bebê Jesus", conclui sua mãe emocionada, após o cômico choque inicial.

Ted vira notícia e mesmo com toda a fama que o arrebata, a promessa de "melhores amigos para sempre" não é jamais enfraquecida; os dois crescem juntos e inseparáveis, fieis ao importante voto. Até o dia em que John começa a namorar…

Agora, com 35 anos de idade, um emprego e quatro anos de namoro com Lori (a belíssima Mila Kunis, que dubla Meg em Uma Família da Pesada), John ainda continua muito apegado a Ted e sempre deixando suas responsabilidades em segundo plano, inventando desculpas para fumar bongue, beber cerveja e assistir Flash Gordon com seu amigo felpudo.

Lori, cansada dessa postura displicente, dá a John um ultimato: “Eu preciso de um homem! Não de um garotinho com um ursinho de pelúcia”. Bem intencionado com a certeza de seu amor pela garota, ele explica a situação a Ted, fazendo com que ele arrume um emprego e mude para outro apartamento.

Mas o que Lori não sabe é que uma amizade verdadeira não se aparta tão facilmente assim...

Em um exemplo prático, Ted desempenha um papel semelhante ao de Alan em Se BeberNão Case, sendo uma originalíssima metáfora totalmente adequada às diversas situações conjugais e cotidianas. Essa força de expressão é efetivamente valiosa, ainda mais quando aplicada em uma despreocupada comédia e com um personagem tão alegórico.

Ted deve ser visto com atenção, pois cada cena tem um duplo sentido, referência, sátira ou afrontas dispostas sutilmente (ou descaradamente) por MacFarlane. Além disso, há participações de muitas celebridades (importantes ou não) e hilárias menções de muitas outras (importantes ou não). Se você nasceu ou viveu durantes os anos oitenta, muitas piadas e alusões farão mais sentido  - e mais ainda se você for homem e já teve uma namorada.

Nem tudo é perfeito, contudo. A trama (se é que se pode ser chamada assim) é fraca, e a pressa para mudar de assunto (e voltar para a comédia) é percebida; entretanto são pormenores quando analisa-se a obra como um todo (a sequência da briga, por exemplo, compensa qualquer falha na carreira de MacFarlane).

Para ser vista mais do que uma vez, essa excelente comédia consegue ser "quase" que obrigatória.

Curiosidades

Seth MacFarlane além de dublar Ted, proveu todos os seus movimentos através de motion capture (deixando ainda mais eminente sua paixão pela Animação).

Em uma cena os amigos fazem uma rápida piada com 11/9. Isso se dá ao curioso fato de que ambos MacFarlane e Wahlberg tinham vôos agendados no American Airlines 11, avião que colidiu na torre norte do World Trade Center. Wahlberg cancelou o vôo dias antes, pois decidiu dirigir até Nova Iorque e MacFarlane chegou dez minutos atrasados no aeroporto.

Quando Lori olha para o céu no final do filme, é possível ver a constelação Ursa Menor (chamada popularmente lá fora de Little Bear)

Em dezembro de 2012, Ted foi considerada a comédia live-action "R-rated" (sistema de censura americano) mais pesada de todos os tempos.

A sequência, Ted 2, já foi anunciada. As filmagens devem começar no segundo semestre de 2013.

Frase
Can you just email me the rest of this story?

Nota 8

segunda-feira, 2 de abril de 2012

Um conto Chinês (Un Cuento Chino)

2011 / Argentina/Espanha / 93 min
"Um argentino e um chinês, unidos por uma vaca que caiu do céu". Isso pode soar absurdamente estranho, contudo, esse grande filme é, acredite, baseado em fatos reais.

O sistemático cinquentão Roberto (Ricardo Darín) leva uma vida solitária e extremamente metódica, administrando com zelo sua calma loja de ferragens. É tão recluso que ignora constantemente as insinuações da bela Mari (Muriel Santa Ana), a mulher com quem teve um breve romance. Sua rotina, contudo, vira de pernas para o ar (quase literalmente, na criativa cena no início do filme) quando o maroto destino lhe apresenta o jovem chinês Jun (Ignacio Huang), um imigrante ilegal que não fala uma sequer palavra de espanhol. Embora misantropo e neurótico, Roberto possui um bom coração que o impede de abandonar o desamparado rapaz que apenas quer encontrar seu ansiado tio.

A convivência com o chinês desperta em Roberto um conflito de sentimentos e memórias que remetem a seu passado, na guerra das Malvinas. Aos poucos e, mesmo sem se dar conta, seus paradigmas vão sendo quebrados (literalmente, em alguns casos) e as cicatrizes, amenizadas. Mais do que travessura do destino e alusão ao recomeço, fica evidente que entender uma pessoa vai muito além de falar o mesmo idioma e que compreender a si mesmo é a mais difícil tarefa.


A premissa que levou o diretor Sebastián Borensztein a escrever o script, segundo ele próprio,  foi: "Quanto mais longe escapar de si mesmo, mas perto estarás de ti. Quanto mais reprimir-se dentro de si, maior será o golpe que lhe fará sair".
O roteiro é semelhante a Melhor é ImpossívelNinguém é Perfeito e o recente Um Parto de Viagem; contudo, o filme triunfa!

Darín, cuja minha admiração só aumenta desde O Segredo de Seus Olhos, é brilhante. Seu mal humorado personagem é apresentado contando os parafusos de uma nova caixa que supostamente deveria conter 350 unidades e, pela tolerância produtiva, continha um pouco menos. E assim começam os xingamentos; sinceros "Puta madre que me parió!" são abundantes, em momentos hilários de sua excelente atuação.

O chinês Ignacio Huang é um show à parte. Não se entende nada do que ele fala (a não ser que você fale chinês) e não há legendas. Mesmo assim ele consegue expressar suas emoções de forma singular. Prepare-se para rir e chorar... E para chorar de rir!

Com poucos recursos, esse pequeno-grande filme é a prova que os nós brasileiros estamos muito atrás dos argentinos em matéria de roteiro. Simples e cativante, Um Conto Chinês consegue ser uma comédia dramática de alta qualidade que consegue passar uma bela mensagem de maneira sutil e natural, sem pressa e sem estereótipos americanos.
E o que tem a vaca com isso? Bem, esse curioso detalhe cabe a você, digno leitor, descobrir e traduzir.

Curiosidades:

Em espanhol, "un cuento chino", é uma expressão equivalente à brasileira "história de pescador", ou - e ainda mais coerente com o filme (e ao curioso cartaz), "história pra boi dormir".

Após os créditos, surge a reportagem russa verídica da vaca que caiu do céu atingindo um barco pesqueiro.

Frase:

La vida es un gran sin sentido, un absurdo.

Nota 8

quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Melancolia (Melancholia)

2011 / Dinamarca / Suécia
França / Alemanha / 136 mim
O que esperar de um filme de Lars Von Trier intitulado Melancolia? A resposta para esta pergunta retórica pode ser encontrada já nas primeiras cenas e, ainda, em câmera lenta.

Com um enredo simples, o filme, que é dividido em duas partes, mostra inicialmente os conflitos mentais de Justine (Kirsten Dunst) e a reação de sua zelosa irmã Claire (Charlotte Gainsbourg). Subsequente, a reação de ambas quando descobrem que um planeta (chamado Melancolia) colidirá com a terra nos próximos dias.

Tudo se passa na mansão do marido de Claire, John (Kiefer Sutherland), em uma reclusão proposital do diretor (que por diversas vezes impede os personagens de cruzar a ponte para a vila) para restringir e focar na constante mudança de humor dos protagonistas.

Padecimento, amargura, desgraça, desastre; é que se pode esperar das obras de Trier. Neste caso não é diferente. Porém, a calamidade adquire proporções maiores (simplesmente a extinção da raça humana). Contudo, o iminente fim do mundo ainda divide preocupações com coisas muito menores, como por exemplo, a dificuldade em fazer uma curva estreita com uma limusine.

Espere ótimas atuações (Dunst ganhou o prêmio de melhor atriz no festival de Cannes), fotografia nebulosa, cenas em câmera lenta, forte música instrumental e o famoso ensaio sobre o sofrimento. Quem viu Anticristo terá uma forte sensação de déjà vu (ou seria uma sensação de ctrl+c/ctrl+v?), ainda mais com a participação da marcante Charlotte Gainsbourg.

A revelação do final logo no início é algo que aprecio. Como preencher o fator surpresa do fim uma vez que este já foi, despreocupadamente, denunciado?

Prepare-se para, além de não conseguir julgar os personagens, imaginar o que você faria com seus últimos minutos antes da destruição da terra.  É mesmo a esperança a última a morrer?

Trier certa vez disse que um filme de ser como uma pedra no sapato. Particularmente, acho difícil ele ter conseguido esse efeito. Afinal, era de se esperar mais de quem afirmou ser "o maior diretor do mundo".

Curiosidades:

O personagem de Kiefer Sutherland menciona diversas vezes que um campo de golfe deve ter dezoito buracos. No início do filme (em direção ao final) Claire carrega o filho por um local onde há uma bandeira marcadora com o número "19". De acordo com o diretor, o buraco 19 é o Limbo.

Há várias contradições às leis da física tais como trajetória dos planetas, rotação, força gravitacional etc. Devido a alguns desses fatores, a destruição global aconteceria muito antes da colisão (erupções, terremotos etc).

Frase:

The earth is evil. We don't need to grieve for it.

Nota: 7